
Autor: por Mauro Camargo
PGR Paulo Gonet: judicialização é inevitável, mas MP deve respeitar primazia do gestor eleito
Em painel no III Congresso Nacional de Gestão Pública, em Brasília, o Procurador-Geral da República defendeu que a atuação do Ministério Público deve ser criteriosa, garantindo o cumprimento da Constituição sem usurpar o papel dos legitimados pelo voto popular na definição de políticas públicas.
Brasília, DF – A judicialização de políticas públicas no Brasil é um fenômeno "inevitável" devido à própria natureza da Constituição Federal, que se vale de conceitos morais, políticos e filosóficos, obrigando o Judiciário a se debruçar sobre eles. No entanto, essa realidade não confere ao Ministério Público (MP) ou ao juiz o poder de impor sua "melhor versão dos fatos" ou "melhor solução", pois a primazia na escolha dos métodos e fins das políticas públicas pertence aos gestores eleitos democraticamente. Esta foi a principal mensagem do Procurador-Geral da República, Paulo Gonet Branco, durante sua participação em um painel sobre judicialização no III Congresso Nacional de Gestão Pública, nesta sexta-feira, 30 de maio, no hotel Royal Tulip.
"Eu acho que o Ministério Público deve atuar sempre naquilo que é certo, fazer aquilo que o ordenamento jurídico determine. E para isso, nós temos que usar de um critério muito refinado para descobrir qual é o espaço do Judiciário, qual é o espaço do Ministério Público nesse campo das políticas públicas", iniciou Gonet.
Ele explicou que a "judicialização da política pública parece que é inevitável" porque "a Constituição se vale de conceitos morais, conceitos políticos, conceitos filosóficos, e quando a Constituição traz isso para a pauta do jurídico, da pauta do direito, o juiz tem que aplicar. Então ele vai ter que também enfrentar esses conceitos". Isso, segundo o PGR, insere o juiz em uma área que, em outros tempos, era impensável, quando o magistrado era visto apenas como "a boca da lei".
Contudo, Gonet foi enfático ao delimitar o alcance dessa atuação: "Isso não pode significar que o juiz pode tomar qualquer decisão, que o Ministério Público possa querer impor a sua melhor versão dos fatos, a sua melhor solução para os fatos. Quem pode decidir isso é quem tem a legitimidade do voto numa democracia representativa. Então, somos nós por meio dos nossos representantes. Eles têm a primazia, o gestor, portanto, esse tem a primazia na escolha dos métodos, na escolha dos fins, na escolha dos meios pra atingir as finalidades da política pública."
O papel do juiz e do Ministério Público, então, seria o de "apurar se essas escolhas estão dentro do padrão constitucional, quer dizer, se não está sendo tomada uma decisão que é manifestamente abusiva, desproporcional ou que contrarie algum valor constitucional impositivo". Não havendo tal desvio, cabe a eles "trabalhar pra implementar essas políticas públicas".
Outra função crucial do MP, segundo o Procurador-Geral, surge quando o administrador se omite em cumprir deveres constitucionais. "A Constituição passou a impor ao administrador uma série de tarefas positivas. Quando ele não faz isso, ele comete também uma agressão à Constituição", afirmou. "E aí sim entra novamente o papel do Ministério Público, que é de compelir, de gerar condições para que o administrador perceba, pra que o agente político perceba que tem que atuar."
Mesmo nesses casos de inércia, Gonet esclarece que "não cabe, ainda assim, ao Ministério Público dizer o que é que deve fazer. O que cabe para o agente é dizer: 'algo tem que ser feito, se nada for feito, aí, sim, a gente pode propor alguma solução que seja adotada e imposta pelo Judiciário'".
Para o PGR, a judicialização, quando bem compreendida e exercida, não leva necessariamente ao ativismo político. "A primeira opção, quando há vários caminhos para serem tomados, é do administrador, é daquele que tem a legitimidade do voto popular. Os órgãos técnicos, o Judiciário, o Ministério Público, eles acompanham esse processo. Se esse processo está num momento de inércia, ele tem o dever de impulsioná-lo e se ele está assumindo um rumo que é impróprio, aí ele também deve interferir", detalhou.
"Se nós entendermos exatamente qual é o papel do Judiciário e do Ministério Público, a democracia tende a funcionar de um modo muito eficiente e proveitoso para o interesse da sociedade", concluiu Paulo Gonet Branco.
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